21 dezembro, 2009

Avatar (Avatar)




É comum que um filme em que se gastou muito dinheiro na produção faça uma extensa campanha promocional. E, em tempos de mídias sociais e ações interativas, é comum que use-se de artifícios cada vez mais criativos para fazer com que o filme seja não apenas esperado, mas ansiado - e Dark Knight é possivelmente o melhor exemplo disso. James Cameron e sua equipe, para promover o mais novo filme dirigido por ele, e o primeiro desde Titanic, fez, como se esperava, uma vasta campanha de marketing. Mas, ao contrário dos outros que mostram pequenos trechos e contam detalhes apimentados da trama, que fazem os espectadores contorcerem-se até que possam finalmente assistir o filme, eles optaram por bradar os atributos de inovação que o filme supostamente trazem, anunciando uma “nova forma de fazer cinema”, “uma experiência completamente nova em assistir filmes”, e marcando a data em que o cinema não mais poderia ser feito se não usasse 3D e outras tecnologias que o próprio Cameron teria ajudado a desenvolver. Muito antes de qualquer cena do teaser trailer ser divulgada, essas expressões já estavam na internet sendo repetidas à exaustão por todos. Fizeram uma “estreia do trailer” e outras ações para convencer, especialmente a crítica, de que o Avatar era mesmo tudo isso. E, depois da estreia, parece que todo o barulho funcionou, e a crítica está quase toda embasbacada.

Quase. Vou tentar ser o mais justo e imparcial possível aqui. E, fazendo justiça, a produção é excelente. Se levarmos em conta que praticamente nenhum cenário é real, e que a animação por computador toma quase todo o filme, é de fato espantoso. Os personagens digitais – muitos, diga-se de passagem – são praticamente uma obra prima, em modelagem e na perfeição dos movimentos, inclusive e especialmente os faciais. A complexidade de algumas cenas de ação, e também de alguns trechos dramáticos, é imensa, e se pensarmos que em pouquíssimos momentos nos damos conta de que tudo o que estamos vendo é resultado de criações digitais, é realmente uma evolução e tanto no cinema. Mas, voltando à realidade, nada disso foi de fato criado por Cameron. Toda a parte de animação digital foi feita pela Weta, a produtora de efeitos criada por Peter Jackson especialmente para O Senhor dos Anéis – que espantou o mundo com um Gollum excepcionalmente realista, e um King Kong talvez ainda melhor. A captura de movimentos, por sua vez, é ideia de Robert Zemeckis, que a usa desde O Expresso Polar. Mas, sim, Cameron levou a tecnologia a um ponto que Zemeckis não tinha ainda atingido. E, também, a profundidade do 3D é mesmo sensacional – e posso apenas imaginar como é a experiência em Imax, que infelizmente ainda não pude conhecer. De realmente novo, no entanto, só uma coisa: as legendas em filmes 3D. Por isso, muito obrigado, Cameron.

E assim chegamos à história em si, e à parte em que o diretor começa a fazer mais diferença. E aqui temos nada mais nada menos do que James Cameron. Se nos lembrarmos de outras produções famosas e faladas do diretor, vamos chegar sempre à mesma conclusão. Alien, O Segredo do Abismo e Titanic conquistaram fãs pelo mundo e ganharam prêmios, mas são todos filmes que se penduraram nos efeitos especiais e na ambientação para funcionar. Um olhar um pouco mais treinado acaba sempre pensando “imagine isso nas mãos de um diretor bom de fato”. Isso se reflete no tratamento da história, no ritmo, na atuação, um pouco na edição. Em tudo isso, Avatar é não mais do que um filme de médio para bom. Um filme de James Cameron. Há, sim, momentos ótimos e grandiosidade aqui e ali. Sam Worthington, é preciso dizer, é um talento a ser bem melhor explorado. Sua atuação se destaca em meio a performances médias – que são influências diretas do diretor, como o casal principal Leonardo DiCaprio e Kate Winslet em Titanic.

Voltamos assim à expectativa criada ao redor de Avatar. Para o público em geral, a promessa era de diversão cinematográfica como nunca vista. Passado o impacto inicial, acredito que essa etapa foi apenas quase atingida, e o filme não resistirá a um segundo olhar mais atento. Para a crítica e os cinéfilos, anunciaram um cinema totalmente novo, em forma e conteúdo. Essa não aconteceu. Como em outros filmes de Cameron, o que eu consigo pensar são coisas como “o que faria um diretor que sabe tratar melhor a história e dá-la profundidade? Ou alguém que saiba extrair dos seus atores as performances excelentes que eles podem dar? Ou mesmo um que saiba pesar a ação e o drama em um composto equilibrado de diversão e reflexão?” E há vários nomes que se encaixam. No fim das contas, parece que o maior talento de Cameron é conseguir reunir um ambiente excepcional para a confecção de um filme, e conseguir montanhas de dinheiro para realizá-lo, características que fazem dele um produtor sem igual.

Mas, como disse no primeiro parágrafo, todo o barulho em torno do filme funcionou – como quase sempre funciona. E a crítica em geral adoro;, o público, como em Titanic, assiste repetidas vezes sem se preocupar com a qualidade do produto. Também como em Titanic, é possível que Avatar praticamente monopolize o Oscar em 2010, e com isso passamos à frente a mediocridade cuidadosamente planejada para parecer grandiosidade. Não entendam mal, medíocre quer dizer na média. E é essa a nota que, no fim das contas, o filme merece.

18 dezembro, 2009

A Princesa e o Sapo (The Princess and the Frog)




A Disney volta à animação desenhada à mão com A Princesa e o Sapo – o último longa para cinema da gigante foi Nem Que a Vaca Tussa, de 2004. Voltou para cumprir uma promessa antiga, de apresentar uma princesa negra. O primeiro roteiro – onde a princesa chamava-se Maddy – teve que ser mudado por críticas sugerindo escravidão e por ser “clichê demais”. Depois de conseguir se acertar com o roteiro – apesar dos clichês estarem, como sempre, presentes – a história ficou bastante simpática e envolvente. E, claro, totalmente Disney.

No bom sentido. Afinal, é o mínimo que se espera da produtora que é praticamente a responsável por tornar a animação uma forma séria de cinema – sim, podemos dizer que mesmo as animações europeias e asiáticas não encontrariam distribuição se não fosse pela Disney ter aberto a estrada. Toda a fofura e atmosfera de sonho que uma história de princesa requer estão lá, deliciosamente ambientada na Nova Orleans do começo do século passado e recheada dos personagens sempre memoráveis, transformados pelo contexto. A fada madrinha aqui é uma feiticeira vodu, o grilo falante é um gentil vagalume apaixonado, e a festa no castelo é na verdade a parada do Mardi Grass, o carnaval da cidade.

Apesar disso – ou talvez por conta disso – não é a melhor animação da Disney, nem mesmo uma das melhores. Mas nem por isso deixa de ser muito boa. Para os adultos que cresceram com os filmes do grande estúdio, é sensacional a pequena volta ao mundo da infância. Para os nossos filhos, é diversão garantida, mesmo em meio à revolução que a animação por computador continua promovendo.

29 novembro, 2009

Os Fantasmas de Scrooge (A Christmas Carol)




A mais clássica das histórias de Natal já ganhou inúmeras versões, que vão dos Muppets à comédia romântica, passando pelas atualizadas e pelas paródias mais bobas. Scrooge é um personagem que já pertence ao acervo cultural da humanidade, junto àqueles que todos conhecemos, mesmo sem saber a origem, e que inspiram outros vários – o Tio Patinhas foi um deles, seu nome original é inclusive Uncle Scrooge. Mas, mesmo com todas essas versões, nenhuma ainda tinha utilizado muito do teor original do texto de Charles Dickens, e Robert Zemeckis decidiu fazê-lo, utilizando sua agora conhecida tecnologia de captação de movimentos aliada à animação por computador.

Como em Beowulf, a modelagem é impressionante, no nível de detalhamento e iluminação realistas. Mas, também como no anterior, os movimentos ainda não estão perfeitos. Há algo de mecânico que ainda precisa ser resolvido, uma fluidez que a técnica de animação sem captação de movimentos já resolveu. É quando mais depende dos movimentos que algumas cenas perdem a magia. Entretanto, as expressões faciais aqui estão em um nível bem superior aos anteriores, aproveitando bem os trejeitos de Jim Carrey em seus vários personagens na produção.

É a primeira vez que a Disney usa a tecnologia de Zemeckis. E, levando-se em conta que é a Disney, e que é uma história de Natal em animação, espera-se um filme infantil. Mas muito cuidado ao levar crianças, o filme é talvez forte demais para elas, tamanho o peso nas cenas macabras e assustadoras. Uma em especial – e justamente a que mais foge do original de Dickens – é bastante desnecessária, uma perseguição típica dos filmes de terror baratos. Os pequenos não terão tanta diversão quando os pais podem imaginar.

25 novembro, 2009

Fama (Fame)




Quem me acompanha pelo Twitter sabe que sou contra remakes, especialmente dos filmes que já são bons. Mesmo assim, fui assistir à nova versão de Fama, o excelente musical dirigido por Alan Parker no longínquo 1980. É preciso dizer que, infelizmente, a versão de Parker não é muito conhecida aqui, especialmente pela nova geração. É preciso dizer, também, que esta versão não se compara à original, em diversos aspectos. Mas sejamos realistas, uma foi feita por Alan Parker, e outra pelo estreante Kevin Tancharoen, que até então fez algumas poucas séries e videoclipes.

Mas, desconsiderando isso, o novo Fama não é de todo mau. Pelo contrário, há algumas surpresas, cenas muito boas, edição de qualidade, certos diálogos excelentes. Sim, é pouco se considerarmos a base original. E é aí que precisamos falar: esta versão é claramente uma forma de Hollywood aproveitar-se da onda “High School Musical”. O original conseguia, mesmo com muitos personagens, aprofundar-se até certo ponto em cada um, explorar não apenas seus talentos mas também seus dramas pessoais. O roteiro perdeu muito da ousadia que teve em Parker – também para encaixar-se na expectativa do público adolescente acostumado à produção da Disney.

Em comum, protagonistas desconhecidos e talentosos, rostos que poderemos ver novamente em breve, se bem aproveitados; e um pouco da estrutura em capítulos. O elenco de professores, entretanto, conquista cada cena. Mas devo confessar que enxergo dois pontos muito bons neste filme: ele fará com que muitos adultos, que não conhecem o original e aventuraram-se nos cinemas para esta, tenham curiosidade e voltem à versão de Parker; e é, sem dúvida, bastante divertido.

13 novembro, 2009

Código de Conduta (Law Abiding Citizen)




Às vezes a intenção de uma história é perdida em meio a alguns malabarismos textuais. Esse parece ser o principal problema de Código de Conduta - além do título traduzido, nada a ver com o "Law Abiding Citizen" do original, que significa "cidadão cumpridor das leis". Tudo se encaixa bem. Há um bom elenco, a direção é competente, os efeitos especiais são bem colocados. Mas faltou aquela peça que faz tudo encaixar com perfeição: o roteiro melhor trabalhado.

Na história, vemos o personagem de Gerard Butler arquitetar uma sequência incrível de eventos com o intuito de vingar-se do "sistema", que levou o assassino da sua esposa e filha a ser libertado por conta de um acordo com o promotor de Jamie Foxx. A caracterização dos personagens é eficiente, não colocando um ou o outro no papel de vilão ou mocinho definitivo. Mas o intuito principal da trama se perde ao prender-se demais ao combate entre os dois, sem que a lição esperada aconteça.

F. Gary Gray dirige bem, mas faltou um pouco mais de atenção ao roteiro, provavelmente por parte de Kurt Wimmer. Ambos são escolados em boas histórias em que o que nos prende é tentar descobrir como tudo acontece. Gray dirigiu o bom filme de roubo The Italian Job, e Wimmer escreveu, no mesmo tema, Thomas Crown. O suspense e a nossa vontade de entender tudo logo estão lá, mas falta o que se pode chamar de "moral da história", que nesse caso deveria estar lá.

11 novembro, 2009

Michael Jackson's This Is It




Anunciado no início de 2009, a turnê This Is It marcaria não apenas a volta de Michael Jackson aos palcos, como também sua despedida. Com sua morte, a filmagem das preparações foi editada em forma de documentário, que inicialmente seria lançado como um substituto dos shows - apenas nas cidades onde a apresentação aconteceria, e por apenas duas semanas. Felizmente, algo mudou no plano original do filme e ele não só estendeu seu alcance como também sua duração.

O mundo estranho de Michael Jackson é bastante conhecido, e está em um sem número de livros e outros documentários - que pipocaram ainda mais aproveitando-se da morte do artista. Este, como registro definitivo, foca não no homem, mas no astro. É um passeio íntimo pelos bastidores do que seria não apenas a última apresentação, mas a mais completa. Nela, podemos ver que, aos 50 anos, os principais talentos de Michael estavam intactos. Os passos saem fáceis e harmoniosos, e ele não faz feio frente à equipe de excelentes dançarinos escolhidos a dedo. Sua voz também, continua afiada e afinada, e descobrimos aqui que ele não só canta, mas entende muito de música. Suas peculiaridades deixam-se aparecer no perfeccionismo buscado para cada música, cada tom.

A edição mostra sempre a preparação de uma música seguida de ensaios de palco. A seleção do repertório do último show foi feita sob medida para os fãs, para a despedida. Se não as melhores, certamente as mais conhecidas estariam lá. E recheadas de efeitos especiais, pequenos filmes feitos especialmente para interagir com o show, e as coreografias que sempre o acompanharam. Podemos ter uma ideia do grandioso espetáculo que nos aguardaria.

É interessante notar que a equipe mostra quase reverência ao astro. Dos músicos aos técnicos, o diretor Kenny Ortega e os dançarinos, todos têm total atenção em Michael e a seus desejos. E, ainda assim, todos estão surpreendentemente felizes, como vemos nos vários sorrisos espontâneos à sua volta, e na forma respeitosa como todos param para ouvi-lo ensaiar suas músicas. Tudo isso mostra que, no final das contas, não havia mesmo outro título para ele que não Rei do Pop.

09 novembro, 2009

Besouro




Besouro começou sua divulgação muito antes de ser concluído, e chamou a atenção de cinéfilos Brasil afora. Era de fato uma novidade e tanto. Um filme sobre um personagem brasileiro tão interessante quanto desconhecido, sobre a arte marcial nascida aqui, e feito com aspirações grandiosas. As primeiras imagens lhe valeram o apelido de "O Tigre e o Dragão brasileiro", bastante influenciada pelas coreografias e efeitos especiais de Hian-Chiu Ku, que de fato comandou o mesmo departamento no filme de Ang Lee, entre outros. Pouco a pouco, o interesse foi crescendo, em uma estratégia quase como a que vemos em grandes produções internacionais.

João Daniel Tikhomiroff dirige seu primeiro longa com um bom aproveitamento das paisagens baianas, algumas tomadas muito boas, e também um ou outro diálogo ótimo. Perde um pouco o ritmo e alguns momentos, e deixa de aproveitar a história em outras. Fotografa muito bem, realçando o amarelo da região. Quase tudo está muito bom. Uma pena que não se possa dizer o mesmo do elenco.

Aílton Carmo, capoeirista de verdade, consegue bons resultados nas cenas de ação como Besouro - que infelizmente não são tantas quanto poderiam. Mas ele ainda precisa de muito treino como ator. Chega a ser curioso a forma como a câmera parece fugir dele justamente nos momentos das suas falas ou em que seria exigido dele a demonstração de alguma emoção. Sua cara fechada mirando o horizonte, entretanto, é farta na película. Um contraste e tanto com a ótima atuação de Flávio Rocha, o Coronel, e do talento potencial de Jessica Barbosa, a Dinorá.

O grande problema de Besouro é a quantidade de "quases" - cada um deles afastando mais de um ótimo filme. A indefinição entre um filme histórico e de ação, a perda do ritmo em pontos chave, e o elenco pouco trabalhado atrapalham. Ainda assim, merece muito ser visto, como representação do que o nosso cinema pode fazer, em termos de roteiro, personagens e produção como um todo. É um filme que não muitos anos atrás seria inimaginável, e por isso é bom que, mesmo não sendo perfeito, ele tenha chegado às telas com algum destaque. Merece uma nota boa pelo pequeno marco que representa no cinema nacional.

08 novembro, 2009

Substitutos (Surrogates)




Basta ler a sinopse de Substitutos para nos lembrarmos de Blade Runner. O mote é bastante parecido, apesar de também bastante criativo: uma tecnologia é capaz de criar cópias androide de qualquer pessoa, controlada à distância pela própria, e assim temos um mundo em que ninguém mais sai de casa, apenas manda seus substitutos no lugar, uma espécie de Matrix sem Matrix. O diretor Jonathan Mostow consegue imprimir um ritmo interessante entre o suspense e a ação. Mas não se enganem é um filme prioritariamente de ação, apesar das várias vertentes filosóficas que a trama sugere.

Mostow, que dirigiu Exterminador do Futuro 3, parece gostar da coisa. Além da mais famosa franquia de robôs, ele dirigiu também recentemente um filme para TV em que um alien se infiltra entre a humanidade. A comparação com Blade Runner, entretanto, é injusta. Além da diferença gritante na direção, o tratamento do roteiro é, em Substitutos, bem mais superficial. Mas é interessante a fotografia usada para fazer com que os androides apareçam perfeitos - apesar de ser uma pena que o Bruce Willis robô pareca um Backstreet Boy emo.

Bruce Willis faz o papel de sempre em filmes de ação, claramente pouco entretido com a produção. Sua parceira, Racha Mitchell, também não precisou de muito esforço, o que deixa claro que não é uma superprodução daquelas para conquistar o mundo. Mas é um filme bem feito e produzido, com efeitos convincentes e uma história que, mesmo sem ser utilizada em todo seu potencial, diverte.

01 novembro, 2009

Bastardos Inglórios (Inglorious Basterds)



Pegue uma boa ideia, coloque algumas cenas chave - como uma especialmente longa, uma com um personagem importante descalço, uma filmada bem de cima - adicione diálogos bem trabalhados e encha de referências - do cinema, da cultura pop, dos seus próprios outros filmes. Trocando em miúdos, é assim que Quentin Tarantino trabalha. Claro que, escrito assim, parece muito fácil. Mas colocar todas essas marcas de estilo, e muitas outras, sem terminar com uma peça confusa depende de muito trabalho.

Tarantino anuncia os filmes que fará com muita antecedência, porque começa a trabalhar neles com muita antecedência. As primeiras ideias de Bastardos Inglórios surgiram antes que começasse a escrever Kill Bill - tanto que algumas foram usadas no próprio. Essa característica faz de suas produções sempre obras de arte. Infelizmente, não é uma arte fácil de ver, já que outra característica de Tarantino é a violência explícita. Ainda que aqui ele consiga fazê-la incrivelmente divertida.

Bastardos é provavelmente o filme mais complexo do diretor. Além de um elenco bem mais longo que os outros, há também a forma primorosa como trabalhou as várias personalidades, não deixando lacunas. E, como sempre, ele dirige bem seus atores. Seria perda de tempo dizer quem está bom, todos estão. Um pequeno destaque para o austríaco Christoph Waltz em sua primeira produção norte-americana, no papel do detetive da Gestapo inspirado em Sherlock Holmes - ele inclusive fuma um cachimbo do mesmo modelo.

Por mais que gere controvérsias, é inegável: Tarantino sabe fazer bom cinema. Domina a técnica narrativa como poucos, e a câmera como menos ainda. É capaz de colocar sua marca inclusive nos erros propositais que comete, e de deleitar os cinéfilos com uma qualidade que infelizmente torna-se cada vez mais rara. É difícil dizer qual é o melhor filme dele, mas posso afirmar que neste ele exercitou seu talento combinado à experiência da sua já longa carreira. Imperdível.

24 outubro, 2009

Jogando com Prazer (Spread)




Um filme em que Ashton Kutcher representa um rapaz aproveitador que vive de golpes em ricaças, que ele nutre com gentilezas e favores sexuais. Em outras palavras, um filme feito para que Kutcher não precisasse gastar nada do pouco talento. Feito por ele inclusive, já que sua produtora assina a fita. Assim é jogando com prazer, possivelmente o mais tolo de 2009.

O diretor David Mackenzie uniu-se ao roteirista estreante Jason Dean Hall para tentar convencer com a história do jovem aproveitador que se apaixona de verdade e, por isso, se arrepende. Mas encheu o filme de clichês e esqueceu de acrescentar conteúdo, e também estilo. No começo, as sequências de cenas de sexo dão a entender que é um filme para garotos adolescentes. Mas depois que ele se apaixona, vira quase um romance típico de garotas adolescentes.

E parece que tentaram convencer com o elenco, escalando Anne Heche para contracenar com Kutcher. Apesar de que colocá-la no poster foi uma jogada ruim, já que é Margarita Levieva que realmente importa na história. Enfim, uma salada pouco organizada, daquelas que mereciam ir direto para a sessão da tarde.

17 outubro, 2009

Te Amarei Para Sempre (The Time Travaler's Wife)




Viagens no tempo costumam ser tema de ficção científica e, no máximo, comédias bobagentas. Quem diria que poderia se prestar a um drama romântico? Pois Te Amarei Para Sempre - péssima tradução para The Time Travaler's Wife - mostra que, sem dúvida, uma boa história pode surgir de qualquer bom mote. O livro de 2003 teve os direitos comprados para o cinema antes mesmo de ser lançado, em um golpe inteligente do então casal Brad Pitt e Jennifer Aniston, que pretendia estrelar a produção, cuja direção foi oferecida a Steven Spielberg, Gus Van Sant e David Fincher. Demorou, mas ganhou as telas, em uma tímida estréia no momento morno da indústria.

Toda a produção é marcada por nomes de segundo escalão. O diretor, Robert Schwentke, tem apenas um outro filme mais ou menos conhecido no currículo, Plano de Vôo, com Jodie Foster. Ele comandou Eric Bana e Rachel McAdams em um filme bem fotografado e com um ritmo excelente para um filme com as idas e vindas típicas das viagens no tempo. Além do ritmo, ele não faz feio no controle dos atores, inclusive da ótima Hailey McCann com seus apenas 13 anos.

Mas o sabor maior do filme está mesmo na história. Bem contada, capaz de utilizar com inteligência mesmo os paradoxos da existência de viagens no tempo, e de contornar com graça alguns dilemas morais dos viajantes - não gosto de contar cenas, mas esta vale a pena, e não é essencial na trama: em uma das viagens ao futuro - que são involuntárias e imprevisíveis - o personagem principal volta com os números da loteria.

Confesso que entrei na sala pensando apenas em passar o tempo. Mas saí surpreendido com a qualidade da narrativa, e ainda assim com a simplicidade e aparente superficialidade do filme, que ainda é capaz de deslocar o problema central para a velha questão do relacionamento e da vida a dois. Depois de passar pelos outros bons títulos em exibição - que vergonhosamente ainda não assisti - vale a pena conferir este.

08 outubro, 2009

Tá Chovendo Hambúrguer (Cloudy With a Chance of Meatballs)




A Sony entrou na briga da animação por computador com O Bicho Vai Pegar, em que tinha uma história interessante e um belo visual. Depois avançou um pouco com Tá Dando Onda, novamente com uma história interessante, mas com o tempero do estilo documentário e uma modelagem impressionante. Mas nenhum fez mais sucesso do que este Tá Chovendo Hamburguer - ignoremos a estranha preferência dos tradutores brasileiros pelo "tá". Aqui, o visual parece ter dado um passo atrás. Parece, porque, apesar das texturas realmente não estarem tão boas quando Tá Dando Onda, a complexidade dos elementos e dos cenários aumentou muito. E a história também.

O mote principal é, coincidentemente ou não, basicamente o mesmo dos outros da Sony: alguém tentando se encaixar no mundo. Pode ser uma indicação de que o estúdio busca seu lugar no CG, depois de ter entrado tardiamente. Com poucas produções, ainda não temos uma "cara" Sony nas animações. Por isso, por melhor que seja o filme, ainda não é páreo para a Dreamworks ou para a Blue Sky - a Pixar já se descolou do grupo, não vale mais como comparação.

Como o primeiro com a tecnologia 3D, e com uma história perfeita para abusar disso - coisas caindo do céu - é preciso dizer que ainda não foi a melhor utilização. Sim, há a profundidade - e em algumas cenas ela é realmente importante - mas o aproveitamento muitas vezes deixa a desejar. O roteiro é cativante e bastante divertido, mas faltou alguma coisa, aquele toque especial.

Também não foi a melhor época para o lançamento - ou talvez tenha, já que esperou passar o caminhão das férias e das outras animações que são bem melhores. Em resumo, é a Sony ainda testando o seu caminho. Há potencial, mas ainda faltou mostrar a que veio.

28 setembro, 2009

Diário Proibido (Diario de una Ninfómana)




Em 1999, uma terapeuta decide, por curiosidade e em busca de auto-conhecimento, trabalhar como prostituta. Isso é real, embora pareça mote de um filme. A terapeuta chama-se Valerie Tasso, e depois de um livro sobre as experiências como prostituta, entre outros, é hoje uma respeitada escritora. E o tal livro acabou inspirando uma obra cinematográfica, Diário Proibido - versão brasileira do título original Diário de uma Ninfomaníaca.

Uma coisa tem que ficar clara: um filme com a palavra "ninfomaníaca" no título terá, necessariamente, muitas cenas de sexo e nudez. Mas se você é um adolescente em busca de algo próximo do que passa nos canais de filmes na TV paga tarde da noite, não entre. Aqui o que temos são cenas bem trabalhadas para encher a tela do assunto em questão mas fugir habilmente da vulgaridade. Christian Molina, um nada conhecido diretor europeu, merece alguns pontos por isso.

A história é bem contada pela protagonista Val, a bela Belén Fabra, que também foge do esteriótipo das mulheres que se esperaria ver em cenas tórridas, com seus trinta e poucos anos e poucas curvas - mas não por isso menos bela, e esbanjando sensualidade no seu olhar apaixonante. Do seu ponto de vista, vamos da incompreensão com sua própria condição ao extremo de tentar usá-la para algum proveito, e por fim à compreensão.

Não fosse o ponto central da trama, um tanto forte, seria como uma fábula moderna, uma versão da eterna busca por si próprio, bem contada. Há alguns detalhes que poderiam ser melhor arranjados, mas é uma boa surpresa nesta entressafra recheada de bobagens das salas de cinema.

26 setembro, 2009

A Verdade Nua e Crua (The Ugly Truth)



Junte os ingredientes certos para uma comédia romântica e você pode ter uma peça surpreendentemente boa, como Harry e Sally ou Notting Hill. Mas se você se preocupar apenas em fazer uma colcha de retalhos de outras produções, você terá só mais uma comédia romântica. E é isso que temos em A Verdade Nua e Crua. Aqui, Robert Luketic - responsável pelo honesto Quebrando a Banca - e sua roteirista, a estreante Nicole Eastman, apenas pegaram várias situações já usadas e fizeram um pequeno update.

O casal principal tem um rosto mais ou menos conhecido, Katherine Heigl, fazendo par com o novo queridinho das telas, o überman Gerard Butler. Os dois estão apenas bons em seus papéis, como o resto do elenco. Há a fiel assistente, a cena de orgasmo em lugar público - que mistura o restaurante de Harry e Sally com a reunião de Em Busca do Prazer - e a sequência de eventos típica do gênero.

Sim, você já sabe o final da história, e o meio não chega a ser nenhuma surpresa também. Há, claro, situações engraçadas, e um ou outro diálogo promissos, mas pouco além disso. É um filme típico do período entre temporadas, um passatempo para diretores, atores e público sem qualquer pretensão. Felizmente, há pouco o que errar em se tratando de comédias românticas.

13 setembro, 2009

O Sequestro do Metrô 123 (The Taking of Pelham 123)



As primeiras notícias que apareceram sobre o último filme de Tony Scott foram que ele se considerava um "pintor de cenas", orgulhoso pela forma como pensava no filme como uma peça visual. Confesso que torci o nariz para essas declarações, e que depois fui obrigado a admitir que, sim, é um filme muito bonito. A fotografia é de uma beleza rara em filmes e suspense/ação como este, com tomadas em profundidade e um cuidado com o código de cor de cada ambiente que não se vê muito por aí.

Bem, e praticamente é só isso. O roteiro é apenas bom o suficiente para chegar até o final com alguma expectativa, e as atuações, apesar dos grandes nomes envolvidos, são só boas como se espera de artistas como Denzel Washington, John Travolta e John Turturro, entre outros bons atores. E olha que é um gênero que Scott entende bem. Ele é responsável por alguns filmes que mesmo quem nunca viu sabe do que se trata, como Top Gun, Dias de Trovão e Inimigo de Estado, sem falar na participação no projeto The Hire da BMW com o segmento Beat The Devil.

Este não vai entrar para o rol das grandes produções do irmão de outro famoso Scott, o Ridley. Vai agradar mais os adolescentes e homens interessados em ação do que quaisquer outros.

12 setembro, 2009

Amantes (Two Lovers)




Amantes teve, para o bem ou para o mal, uma publicidade inusitada: Joaquin Phoenix, o protagonista, supostamente abandonou a carreira de ator para tornar-se um ser estranho que mistura um lacônico barbudo trajado a la Blues Brothers e, pasmem, rapper. O quanto isso é real ou uma jogada para um filme próximo, ninguém sabe ainda. Mas o fato é que foi assim que ele compareceu - quando apareceu - aos eventos de lançamento do filme. Que aqui, chegou tarde, bem tarde, quase um ano depois de sair lá fora - quem fez alguma viagem internacional pode assisti-lo no avião antes de vir para os nossos cinemas.

Faltas de explicações e bizarrices comportamentais à parte, é um filme que merece uma olhada pelos amantes do cinema. Phoenix está ótimo, talvez no seu melhor papel, medindo com habilidade a timidez e estranheza do seu personagem, e ditando o ritmo das cenas. Gwineth Paltrow e Vinessa Shaw estão ambas muito bem nos papéis das mulheres que dividem o pensamento de Leonard. Participações especiais como a e Isabela Rosselini são uma pitadinha de sabor à mais.

Bem trabalhado tecnicamente, Amantes mantém um bom ritmo, só vez por outra tropeçando sem muito problema. O diretor e roteirista James Gray foge do típico cinema de autor - ele escreveu e dirigiu todos os seus quatro filmes até agora - fazendo uma peça capaz de agradar cinéfilos e aqueles que procuram apenas uma boa diversão. Esperemos que esta fase de Phoenix passe logo, afinal Gray gosta muito de trabalhar com ele - esteve em três das suas produções. Fácil de ver e de gostar, Amantes merece uma visita.

05 setembro, 2009

Up - Altas Aventuras (Up)




O décimo longa metragem da Pixar, Up - que no Brasil recebeu o sobrenome "Altas Aventuras", é o primeiro do melhor estúdio de animação por computador a usar a tecnologia de exibição em 3D. É também o segundo dirigido por Peter Docter, responsável por Monstros S.A., e o segundo a ter personagens humanos como protagonistas. Como prova da soberania da Pixar, foi a primeira animação, independente de estilo, a abrir o conceituado festival de Cannes.

Up é uma história bastante cativante, mas ao mesmo tempo bastante complexa - apesar de ser bem mais leve e infantil que os dois últimos do estúdio, Rattaouille e Wall-E. Parte de um mote bastante inusitado: o Sr. Fredricksen resolve realizar o desejo da sua falecida esposa e viajar para a América do Sul. A sequência de abertura que mostra como ele e sua Ellie se conheceram, cresceram, casaram e todos as pequenas alegrias e infortúnios da vida é belíssima, uma abertura digna de qualquer filme "sério". Com sua modelagem sempre belíssima, aliada à filtros virtuais que mostram essas primeiras cenas como um filme Super8, já nos primeiros minutos a Pixar dá o seu recado. O que deixa os restantes para muita aventura e diversão.

Infelizmente, é preciso dizer, a qualidade da profundidade que se espera na exibição 3D não é muito bem utilizada, uma pena, especialmente pela expectativa que é gerada pela utilização da tecnologia pela Pixar. Mas isso não atrapalha tanto. Como sempre, os personagens são muito bem trabalhados e muito bem aproveitados, e o roteiro é muito bem escrito, com vários ótimos momentos e diálogos. Aqui no Brasil temos a sorte de ter a voz de Fredricksen dublada por Chico Anísio, o que ajuda bastante.

Apesar do que se anda dizendo, não é o melhor filme da Pixar - título que, para este crítico, continua justamente entre os dois anteriores. Mas, ainda assim, é ótimo, daqueles que vamos guardar alguns trechos e frases para sempre - especialmente os ótimos momentos do cão Doug. E, é preciso também dizer, qualquer um que se encanta com os animais falantes engraçados que são praticamente padrão nos outros estúdios, terá aqui uma riqueza que eles ainda não conseguem alcançar. Para rir e se divertir muito, qualquer que seja a sua idade.

02 setembro, 2009

Os Normais 2




Quando o primeiro Os Normais saiu, em 2003, o diretor João Alvarenga Jr. aproveitou para aplicar todos os palavrões que caberiam tão bem à série mas não eram permitidos. A história contava o antes da série, como Vani e Rui se conheceram, usava alguns artifícios interessantes e era suficientemente engraçada. Seis anos depois, a série há muito terminada, vem a sequência. Pode soar estranho, mas parece que os personagens esperaram todo esse tempo e passaram por todas aquelas etapas para culminar aqui. Muito melhor do que o primeiro, e fazendo tudo que não era permitido na série.

Não que a história seja em si melhor. Na verdade, quase não há história, mas uma série se situações hilárias em uma sucessão bem arranjada, tudo no ponto para tirar do público risadas gostosas quase de minuto em minuto. É tanto que, se a sala estiver cheia como tem estado, você vai certamente perder alguns diálogos, sobrepujados pela gargalhada longa da cena anterior. E não há tema melhor para isso que sexo, bem colocado. E com duplo sentido.

Nada há a dizer das atuações de Fernanda Torres e Luiz Fernando Guimarães. Absolutamente confortáveis nos papéis, eles estão ótimos como estão em praticamente tudo que fazem. E como a história roda em torno deles, o elenco de apoio pode só se divertir também, o que sempre ajuda. As companheiras de banheiro de Vani em uma das cenas iniciais são prova disso. Muitos rostos desconhecidos ao lado de alguns pouco conhecidos, e todas se saem bem. Participações muito especiais de Daniel Dantas e Cláudia Raia são o complemento certo.

Na linha do previamente comentado Se Beber, Não Case, Os Normais 2 é diversão das mais despretensiosas, em bom português e com tudo o que tem direito. Mesmo para quem não conheceu a série ou não viu o primeiro, compensa, e muito.

27 agosto, 2009

Se Beber, Não Case! (The Hangover)




Fazer comédias escrachadas pode parecer fácil. Mas não é só pegar algumas sequências absurdas e colocá-las uma depois da outra, existe o famoso e famigerado timing, que é tudo nas comédias, especialmente nas desse tipo. Se Beber, Não Case consegue isso com maestria, pelas mãos de Todd Phillips, que já demonstrava essa tendência em Dias Incríveis. Mas este supera todos os seus anteriores - e por isso mesmo tem feito sucesso mundo afora.

É interessante pensar por onde passou a cabeça dos roteiristas Jon Lucas e Scott Moore para imaginar o cenário que move o filme. Logo após a introdução, é mais ou menos assim: duas coisas a menos - o noivo e um dente - e várias coisas a mais, entre uma galinha, um bebê, um tigre, um gangster chinês gay e Mike Tyson. E o mais incrível é que, no decorrer da história, tudo passa a fazer sentido. Ou quase tudo.

O elenco parte de alguns rostos já conhecidos do segundo time, como Bradley Cooper e Justin Bartha, com outros nem tanto como Ed Helms e o impagável Zach Galifianakis, no papel que é provavelmente o mais engraçado no filme. Juntando com algumas ótimas referências aqui e ali, e algumas participações especiais, o trabalho dos três principais - Justin Bartha é o noivo desaparecido e participa pouco - essa mistura improvável foi muito bem cozinhada.

Não é uma comédia inteligente, mas é uma comédia pastelão como pouco se vê hoje em dia, daquelas capazes de usar alguns pontos mais fortes sem abusar, e que nos faz gargalhar mais forte a cada novo tropeço da história. Por isso, mesmo aqueles mais ranzinzas e adeptos puristas do "cinema sério" devem se aventurar, e se divertir.

26 agosto, 2009

[DVD] A Vida no Paraíso (Så som i himmelen)









A Suécia não é um país do qual você se lembre ter saído algum filme daqueles memoráveis. Então, quando se sabe que há algum bom filme de lá, vale a pena ver do que se trata. A Vida no Paraíso parte de um mote bastante simples e até recorrente: uma pessoa famosa que, sentindo-se perdida, resolve voltar às suas origens, quase sempre simples, e com isso reconectar-se consigo mesmo. Neste caso é um maestro renomado que volta à sua pequena cidade, e lá reencontra o amor à música em meio a um coral de pouco talentosos moradores.

Embora simples, o tema é tratado com muito cuidado, mostrando claramente o que se passa na cabeça do maestro Daniel Daréus e o impacto que ele causa na sua cidade natal. Mas é principalmente sobre o impacto que a cidade e seus habitantes causam nele, numa talentosa inversão do gênero "filme de professor" que não foca nos alunos - no caso, o coral que ele conduz. Muito bem interpretado por Michael Nyqvist, Daniel recupera aos poucos a autoconfiança e nos lembra que, na maioria das vezes, o equilíbrio é o mais importante.

Como tantas pequenas pérolas cinematográficas, passou batido nos cinemas daqui em 2005, apesar de ter sido indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. O diretor, Kay Pollak, não é conhecido e não realizou nenhum outro depois deste. Mas conseguiu aqui, com aquela simplicidade que só é possível através de muito trabalho, passar uma bela mensagem.

Agora também em DVD!






Não tenho conseguido ir tanto ao cinema quanto antes, mas tenho assistido bastante em casa. Então, para não perder os meus já poucos leitores - 12 em média no último mês segundo o Google Analytics - resolvi colocar no Parada Crítica opiniões também sobre os filmes que assisto em DVD. Assim quem sabe volto aos bons tempos de média 20...

Pra recuperar o tempo perdido, vou colocar aos poucos as críticas de DVDs dos últimos quatro meses, então voltem com frequência!

08 agosto, 2009

À Deriva




Vez por outra somos agraciados com cinema brasileiro bem feito. E não me refiro apenas às qualidades que fazem os filmes tornarem-se campeões de bilheteria - na verdade, é quase o contrário. Heitor Dhalia nos agraciou em 2007 com o histriônico e engraçado O Cheiro do Ralo. Em seu novo À Deriva ele nos agracia com uma história que agrada os cinéfilos mais ferrenhos, e também toca qualquer um que se interesse em experimentá-lo. Para fazê-lo, buscou elementos frugais, daqueles que poderiam facilmente permear um episódio de Malhação. Mas não se enganem, é justamente da capacidade de pegar esse mote simples e transformá-lo em um grande filme que surgem as várias qualidades desta produção.

Valendo-se das belas paisagens de Búzios lindamente fotografadas por Ricardo Della Rosa, e pela ambientação remetendo ao início dos anos 80, Dhalia nos revela o mundo pelos olhos de uma garota entrando na adolescência, e encarando aventuras e conflitos talvez maiores do que esteja preparada. A facilidade com que somos levados por Filipa, quase sentindo as suas angústias e alegrias, revela a mão de um diretor que merece ser notado.

A personagem principal é interpretada pela estreante Laura Neiva. Como uma marca da nova geração, ela foi selecionada pelo Orkut, sem nenhuma referência de atuação. É injusto dizer que ela sai-se bem no papel por interpretar, basicamente, a si mesma. Há mesmo nas falhas de interpretação de Laura algo que indica que pode estar ali um talento a ser trabalhado. Tanto que ela não tem dificuldades de contracenar com a experiente Débora Bloch e o internacional Vincent Cassel. A sua trupe de amigos no filme também corrobora esse talento; há alguns claramente treinados no ofício, enquanto outros são tão novos quanto ela.

À Deriva, como Não Por Acaso, é um filme que poderia ter "acontecido" facilmente em algum lugar da Europa. E isso é um sinal de um cinema amadurecido o bastante para saber que pode contar uma boa história brasileira sem ter que apelar para as já vencidas paisagens áridas do Nordeste ou as mazelas urbanas. Provavelmente não vai ser um sucesso de público - nós brasileiros ainda estamos, infelizmente, mais acostumados às facilidades do cinema norte-americano e seus clones - mas vai conquistar qualquer um que abra os olhos e a cabeça para assisti-lo.

15 julho, 2009

A Era do Gelo 3 (Ice Age: Dawn of the Dinossaurs)




Quando o brasileiro Carlos Saldanha conseguiu um emprego em um estúdio de animação que fazia pequenas vinhetas para comerciais de TV, certamente não imaginava o que poderia acontecer. Nasceu a era da animação por computador no cinema e a pequena Blue Sky foi comprada, tornando-se uma concorrente da Pixar e da Dreamworks Animation. Correndo por fora, com um bom título aqui outro ali, ela é e, por enquanto, sempre será lembrada pelo ótimo A Era do Gelo. Então por que não torná-lo uma franquia? Assim foi feito, e estamos no terceiro filme – o segundo dirigido apenas por Saldanha.

A qualidade da modelagem e da animação não surpreende, e o roteiro já não é cheio de surpresas como o primeiro. O impagável esquilo Scrat, que sempre estrela os trailers e é coadjuvante no filme, aparece pouco, o que é uma pena. O ganho de participação que ele teve no segundo foi uma boa jogada. Da mesma forma, alguns dos trejeitos dos engraçadíssimos irmãos gambás também se perderam. Talvez a tentativa tenha sido fazer uma história com um pouco mais de peso, não tão apoiada nas gags, mas aí faltou aquela pitada, aquilo que divide um roteiro bom de um nem tanto.

Claro, não nos esqueçamos que o público principal é o infantil, e esse vai sair satisfeito com as várias risadas que o filme proporciona, e também impressionado com o efeito 3D que agora parece ser básico nas animações. Mas, se pensarmos que temos outros estúdios com boas histórias – e alguns novos entrando – é bom a Blue Sky se cuidar. Pode ser que A Era do Gelo não segure mais um título.

02 maio, 2009

X-Men Origens: Wolverine (X-Men Origins: Wolverine)




O último filme dos X-Men causou uma certa decepção na maioria dos fãs dos quadrinhos - nem tanto para os que só acompanharam as aventuras dos mutantes na telona. E desde o segundo já havia rumores de que Wolverine ganharia um filme solo, o que tornou-se quase uma obrigação depois do terceiro. Negociações e negociações depois, com vários nomes surgindo na direção, incluindo Zack Snyder, finalmente chega, pelas mães de Gavin Hood. Muitos não se lembrarão do nome, mas ele ganhou o Oscar e o Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro em 2006 com o tocante Tsotsi - que é muito bom mas nada parecido com filmes de ação baseados em quadrinhos.

Wolverine é um dos personagens mais interessantes da Marvel. Sua história envolve memórias apagadas e artificialmente implantadas e um passado que nunca fica muito claro, inclusive a sua idade. O filme já começa colocando uma data e, fazendo-se contas rápidas na cabeça, vemos que Wolverine tem, afinal, cerca de 170 anos. Todo o resto segue mais ou menos a confusão dos quadrinhos.

Talvez por uma vontade de agradar fãs da HQ que queriam ver este ou aquele personagem que não apareceu nos anteriores, optou-se por, aqui, encher de mutantes. Em alguns momentos, é demais. Hugh Jackman não é um ator excepcional, e aqui teve concorrência demais para brilhar. Especialmente Liev Schreiber, que se sai muito bem como Victor Creed - apesar de muito neste personagem ter pouco em comum com o dos quadrinhos - e a bela Lynn Collins como Keyla, que aproveita todo o seu charme. Mas, como disse, há muitos personagens, e Hood não consegue manter um nível de qualidade.

Enfim, tudo poderia ser um pouco melhor, para aproveitar o personagem - a trama fica muito em cima da vingança pessoal de Logan e Victor - e trazer de volta aqueles que ficaram desapontados com X-Men III. Como quiseram usar muitos mutantes, acabou-se desperdiçando algumas boas oportunidades para filmes futuros. Apesar disso, para os que se interessam pelo personagem ou pelo estilo da história, não é totalmente ruim.

25 abril, 2009

Eu Odeio o Dia dos Namorados (I Hate Valentine's Day)




Era uma vez a esposa de um grande ator que, ao assistir a um monólogo feminino, recomendou a seu marido que produzisse uma versão para o cinema da peça. Parece história de Hollywood, e é. O monólogo em questão era My Big Fat Greek Wedding, que Rita Wilson, esposa de Tom Hank, assistiu e fez a recomendação. Conta-se que quando Hanks ligou para a atriz, Nia Vardalos, ela desligou pensando que fosse trote. Para sorte dela, não era, e o delicioso Casamento Grego nasceu assim. Depois veio uma série baseada no filme, e Nia ficou um pouco afastada da telona. Agora ela volta não apenas escrevendo e atuando, mas também dirigindo.

O gênero é o mesmo, comédia romântica. Nia faz tudo em um passo acelerado, com muitos diálogos cortados - e vários excelentes. Usa e abusa das referências novaiorquinas, fazendo algumas piadas ficarem mais difíceis aqui. E usa e abusa das gagues; são várias, em alguns momentos, demais, a ponto de alguns se perderem para logo dar lugar ao próximo. Só no terceiro quarto é que o ritmo fica melhor.

Nia estrela no papel principal, com muito charme, e contracena novamente com John Corbert, que está quase no mesmo papel que em Casamento Grego. A estrutura dos personagens é boa, mas a relação entre eles em alguns momentos parece um pouco forçada. O elenco de apoio dá o tom em várias cenas, fazendo um ótimo suporte. Dos ajudantes gays aos amigos esquisitos, os pequenos papéis coadjuvantes são todos muito bons.

Em uma rara inversão, o filme foi lançado aqui antes que nos EUA. Mas, com esse nome, é possível que o plano inicial fosse lançar antes do Dia dos Namorados deles - o Valentine's Day lá é em 14 de fevereiro. Da forma como foi, nem para nós nem para eles usou a referência da data, mas sem problemas. Acabou pegando uma entressafra interessante aqui no Brasil, mas vai sofrer um bocado no lançamento em junho nos EUA, época dos blockbusters. Bonitinho e despretensioso, é um bom filme para as tardes chuvosas ou para um fim de noite sem grandes idéias.